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Fundeb em São José de Ribamar e a Operação Lei do Retorno: quando as linhas se cruzam

A deflagração da Operação Lei do Retorno, pela Polícia Federal em agosto de 2025, trouxe à tona um esquema de supostos desvios de mais de R$ 50 milhões do Fundeb em municípios do Maranhão e do Piauí. Entre os alvos das buscas, aparecem endereços de São José de Ribamar, onde relatórios técnicos já haviam identificado movimentações financeiras que, no mínimo, merecem esclarecimento aprofundado.

No caso ribamarense, chama atenção a emissão de empenhos milionários em 27 de março de 2025, no valor de mais de R$ 8 milhões, antes mesmo da assinatura do Contrato nº 149/2025, ocorrida apenas em 1º de abril. Poucos dias depois, em 7 de abril, novos empenhos completaram o montante de R$ 11,6 milhões. A prática de comprometer quase 70% do valor global do contrato antes de sua existência jurídica não encontra amparo nos arts. 58 e 60 da Lei nº 4.320/1964, nem no art. 105 da Lei nº 14.133/2021, e fere a jurisprudência do TCU, que alerta para o risco de nulidade em tais procedimentos.

A análise econômico-financeira da contratada, R. Oliveira Comércio e Serviços Educacionais Ltda. (Editora Cactos), também desperta preocupações. Indicadores como liquidez corrente (0,61), liquidez seca (0,51) e capital circulante líquido negativo em R$ 1,38 milhão revelam fragilidade financeira. Há ainda a classificação controversa de lucros a distribuir em passivo circulante, contrariando a NBC TG 24/CPC 24, o que distorce índices e pode comprometer a leitura da real capacidade da empresa.

Esses sinais locais ganham outra dimensão quando colocados em paralelo com os alvos da Operação Lei do Retorno. A PF investiga justamente práticas como fraudes em licitações, emissão irregular de empenhos e manipulação de contratos financiados com recursos do Fundeb entre 2021 e 2025. A coincidência temporal e fática não permite indiferença: ainda que não haja imputação direta de responsabilidade, é inegável que as linhas se aproximam e sugerem que a gestão municipal precisa ser imediatamente auditada.

Diante disso, a atuação dos órgãos de controle externo é imprescindível. O TCE/MA, o Ministério Público de Contas e o Ministério Público Estadual devem analisar, com lupa, se os recursos da educação em Ribamar foram empenhados e aplicados com base na legalidade, eficiência e transparência. Mais do que números e papéis, trata-se de garantir que os recursos do Fundeb cumpram sua função constitucional: a valorização da educação básica.

Se a Polícia Federal busca, no plano macro, desarticular organizações criminosas que drenaram verbas da educação, em São José de Ribamar os relatórios já revelam práticas administrativas que, por si sós, merecem apuração rigorosa. Em um momento em que a legalidade orçamentária está no centro da pauta nacional, a gestão municipal de Dr. Julinho não pode passar ao largo desse escrutínio.

A sociedade ribamarense, os professores e as famílias e os alunos sem fardamento quase no fim do ano têm o direito de exigir clareza: os recursos do Fundeb foram aplicados corretamente ou estamos diante de mais um capítulo daquilo que a Operação Lei do Retorno tenta desmantelar?

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